Aparecia quando aparecia, de quando em quando, e sempre sem pressas. Chegava e punha a cadeira, pesada e rente ao chão, sempre no mesmo lugar: ao meio das duas fileiras de cadeiras. Para ficar mais próximo e para evitar toda a distância causada por uma secretária, dizia. Podia não ser um excelente cronista. Podia ter um gosto literário duvidável. Podia ser confuso e, por vezes, pouco coerente. Podia ser tantas coisas quanto se imagine de mau ou de bom. O que guardo é a de um invulgar professor. Não um excelente professor. Não foi sequer um grande professor. Mas um daqueles, poucos, que prenderam a atenção e um daqueles, poucos, que deram espaço para dar largas a toda uma imaginação que só uma cadeira denominada de "Teorias da Modernidade e Pós-Modernidade" dada por ele, podia permitir. Liberdade, liberdade, liberdade. Foi o tão grande apenas que ele me ensinou. Liberdade de dizer, liberdade de pensar, liberdade de divagar. Um sem fim de assuntos ao longo de um curto semestre; um incompreensivel (para mim) diálogo sobre telenovelas entre ele e a minha querida ela com cerca de dez parvos a alternar o olhar ao estilo jogo de ténis de um para o outro; e uma deliciosa e memorável gargalhada.
Eduardo Prado Coelho morreu. Para os outros não sei o que deixou de herança. Para mim deixou isto.